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Por que Lula não consegue reverter a rejeição dos evangélicos?

 





Desde a campanha presidencial de 2022, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrenta dificuldades para se conectar com boa parte dos evangélicos, que segue avessa às ações e pautas do atual governo. Tanto líderes quanto fiéis manifestam uma resistência crescente à sua gestão, intensificando um distanciamento que já se fazia presente. Esse cenário fica ainda mais evidente nos dados levantados pelo PoderData, divisão de pesquisas do Poder360, entre 25 e 27 de janeiro, que apontam uma queda na aprovação do segmento ao terceiro mandato de Lula.

Segundo a pesquisa, 68% dos evangélicos desaprovam o presidente, um aumento de 12 pontos percentuais em relação a janeiro de 2023. O levantamento também identificou um aumento na rejeição entre católicos: hoje, 48% aprovam o governo, enquanto 43% desaprovam. No início do mandato, a rejeição era de 31%

Para reverter esses números, Lula e seus aliados têm reforçado um discurso mais conciliador, enfatizando temas como combate à fome e defesa da liberdade religiosa. Além disso, encontros com líderes evangélicos foram promovidos na tentativa de estabelecer um diálogo e reduzir resistências. No entanto, essas estratégias têm tido pouco efeito.
Confronto, apelos e os reflexos nas pesquisas

Lideranças de direita afirmam que Lula e seu governo representam políticas e posturas que ameaçam os valores defendidos pela comunidade evangélica. Segundo essa perspectiva, a adoção de pautas progressistas em áreas como direitos sociais e de minorias seria incompatível com a defesa da moral e da família, pilares considerados centrais para muitos líderes religiosos.

O pastor Marco Feliciano, conhecido por sua atuação contundente nas redes sociais e nos palanques, tem reiteradamente classificado Lula como uma ameaça aos princípios cristãos. “Não podemos aceitar um líder cuja trajetória política vá na contramão dos valores que prezamos. Lula, com suas práticas, afasta os que lutam por uma sociedade pautada na moral cristã.”

O sociólogo e pastor da Igreja Manaim, Ricardo Bitun, concorda que as diferenças entre pautas conservadoras e progressistas dificultam o diálogo entre o governo e os evangélicos. No entanto, ele também chama atenção para a influência de pastores midiáticos sobre os fiéis, por meio das redes sociais, programas de TV e emissoras de rádio, moldando percepções e ampliando a rejeição. Ele destaca ainda que a batalha nas redes, impulsionada pela disseminação de fake news, contribuiu para a imagem negativa de Lula, um reflexo que persiste até hoje.
Fatores que impactaram

Para Magali do Nascimento Cunha, doutora em Ciências da Comunicação e pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião (ISER), a rejeição persistente a Lula ocorre independentemente das ações e resultados positivos do governo. Segundo ela, isso se deve a uma “cultura anti-Lula”, cultivada e reforçada por lideranças religiosas com grande alcance midiático. “As pessoas recebem essa influência e acabam considerando as ações do atual governo nocivas para a população.”

Ela ressalta que alguns acontecimentos recentes impactaram diretamente as pesquisas de opinião. Um dos principais fatores é o alto preço dos alimentos. Magali aponta que há uma dificuldade generalizada em compreender o contexto dessa situação, que, segundo ela, decorre das catástrofes climáticas de 2024, com prejuízos causados por chuvas e secas, além de outros fatores econômicos.

“Há uma série de situações interferindo nos preços, mas as pessoas não conseguem fazer essa avaliação e acabam responsabilizando o presidente. De fato, o governo tem sido lento em encontrar saídas e está sendo pressionado a isso.”

Outro ponto que, segundo a pesquisadora, influenciou a rejeição foi a polêmica envolvendo a taxação do Pix, recurso amplamente utilizado pela população evangélica, em sua maioria de baixa renda. “Houve muita desinformação sobre isso. A mais repercutida foi um vídeo do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que é evangélico e tem grande influência no segmento. Ele gerou um alarmismo, espalhando temor sobre essa situação.”
Comunicação falha

A relação entre o presidente Lula e a comunidade evangélica tem se mostrado desafiadora. Enquanto a oposição segue mobilizando estratégias para manter essa base alinhada às suas propostas, o governo tenta melhorar o diálogo com esse grupo. Para o pastor Ariovaldo Ramos, coordenador da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, a comunicação ineficiente do governo contribui significativamente para a desaprovação entre os evangélicos.

Ariovaldo também defende que o governo precisa aprender a falar com a população evangélica, compreendendo seus valores e realidades culturais para conquistar a confiança desse eleitorado. Segundo ele, é necessário encontrar pontos de convergência sem abrir mão de suas pautas históricas.

“O governo não consegue convencer que sua luta pelos direitos humanos não é apologia ao que os evangélicos entendem como imoral. Precisa garantir o respeito mútuo, enfatizar o ser humano, independentemente de suas escolhas, e evitar a imposição de ideias que ameacem as convicções do segmento.”
Novas demandas

Os evangélicos representam uma fatia expressiva do eleitorado brasileiro e têm influenciado os rumos políticos do país nos últimos pleitos. Ariovaldo Ramos alerta que, se o governo não enfrentar a desinformação e não compreender as mudanças socioeconômicas e éticas trazidas pelo crescimento evangélico no Brasil, as próximas eleições poderão ser impactadas.

Ele destaca que, dentro da comunidade evangélica, grupos específicos trazem novas demandas, como os negros e as mulheres. “Os negros precisam ser vistos a partir da realidade da negritude evangélica, e não apenas sob a ótica da ancestralidade africana. As mulheres, maioria dentro das igrejas, querem ser respeitadas como mães e trabalhadoras, exigem a garantia de direitos sem que isso seja associado à doutrinação feminista.”

Outro ponto levantado por ele diz respeito à forma como os evangélicos enxergam o trabalho. “Para eles, o trabalho é uma bênção e uma responsabilidade. Eles querem oportunidades para prosperar. Quando o governo cria programas de suplementação de renda, precisa apresentá-los como direitos, e não como benefícios.”

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