A exaltação de ânimos por conta de disputas políticas, principalmente em período eleitoral, tem feito muitos brasileiros pensarem em deixar o país, com o aumento de pessoas interessadas em informações sobre emigração.
É o que aponta o especialista em processos de naturalização de brasileiros no exterior e presidente da consultoria de mobilidade urbana Aquila Oxford Group, Lucas Silva Lima. "Em 2019, o contexto político era a motivação principal de apenas 5% [das pessoas que buscavam os serviços da empresa]. Recebemos em média 100 ligações por dia de pessoas que querem emigrar. Logo após o pleito [2 de outubro], recebemos 400 ligações, a maioria delas tinha como justificativa o contexto político".
Muitos brasileiros, no entanto, ainda não estão na fase de ligar para consultorias como a Aquila Oxford Group, que cuidam de toda a parte de documentação e instrução de brasileiros que moram ou que querem morar no exterior. Mas eles estão firmes no propósito de deixar a terra natal, por conta do motivo que se tornou tão recorrente desde a semana passada.
"Sentirei muita falta da minha família, dos meus amigos e dos meus bichos. Acho que terá um impacto na minha saúde mental também, mas acredito que será muito pior continuar vivendo aqui", diz a engenheira ambiental e mestranda, Luciana Santos, de 30 anos, que pensou em sair do país pela primeira vez em 2016, ano do impeachment da então presidente da República, Dilma Rousseff (PT).
Luciana pensa em ir para Portugal inicialmente, para depois se mudar para a Itália. "O cenário político é melhor no país escolhido para imigrar", justifica ela, que de início tem planos de trabalhar em sorveteria enquanto envia currículos para empresas de engenharia e universidades.
A Itália também é o destino pensado pelo coordenador de sucesso do cliente Bruno Simonetti, de 27 anos. "Não só pelas polêmicas entre candidatos, mas pela desvalorização da moeda, o que causa piora na nossa qualidade de vida, e pela segurança, pois sendo uma pessoa LGBT, me sinto inseguro no país", explica.
Para Bruno, mesmo com a vitória da candidata de extrema-direita, Giorgia Meloni, o país dos seus antepassados parece ter um ambiente político mais tranquilo do que o do local em que nasceu.
"Embora tenha tido essa vitória da extrema-direita, o movimento LGBT nesses países é muito mais forte. Então, não seria tão prejudicial para a comunidade. O Brasil, por exemplo, é o país que mais mata pessoas transexuais no mundo", argumenta.
Advogada da área internacional, Lucia Stella Moura Ribeiro diz que boa parte dos brasileiros não leva em consideração o cenário político do destino escolhido.
"Eles têm a imagem de que qualquer lugar da Europa é pacífico e seguro, que não terá essa questão política", conta Lucia, que atua no escritório Souza & Souza Assessoria Jurídica, que tem unidades em Santos, no Brasil, e em Ericeira, em Portugal.
Para a advogada, a escolha do novo país é importante. "Com um salário de 705 euros em Portugal, as pessoas vivem tranquilamente. Não vão ser ricas, mas conseguem ter o básico, diferente do Brasil, que com um salário mínimo você não faz isso", contextualiza.
"Meu trabalho é com a regularização de brasileiros não só em Portugal, mas o forte é Portugal. A gente trabalha muito com cidadania portuguesa e com migração, como vistos, entre outras coisas", relata.
Brasileiros que já emigraram
Entre os destinos escolhidos por brasileiros que já deixaram o país por conta da animosidade vivida no cenário político, muitos estão localizados na Europa. No entanto, há quem também tenha optado por outros continentes.
"Eu já me sentia insegura no Brasil, mas a instabilidade política me levou a colocar em prática o plano de sair do país, porque eu estava vendo uma polarização muito grande", disse a professora Larissa Ramos, de 31 anos, que mora no Egito desde janeiro deste ano.
O contexto do país africano, embora seja de ditadura militar, não afeta brasileiros da mesma forma que afeta os egípcios, segunda Larissa. "Eu vejo que os estrangeiros têm algumas regalias com relação aos egípcios. Há regras que só se aplicam aos egípcios. Baseado nessas regras, vivo como estrangeira tranquilamente, mas se, por acaso, eu arranjasse um marido egípcio, eu jamais teria um passaporte egípcio, porque assim eu passaria a ter as desvantagens que uma mulher egípcia tem", contextualiza.
Ainda que a motivação para sair do país não tenha sido o contexto político, a professora universitária Fernanda Cruz Rios, de 34 anos, vive nos Estados Unidos desde 2013 e não pretende voltar para o Brasil por conta do que se desenrolou no país após sua saída.
"Dilma já tinha saído, Temer estava no poder. Logo em seguida veio Bolsonaro, cortando cada vez mais os investimentos em educação e pesquisa. Então eu fiquei com medo de voltar e não conseguir um trabalho que me sustentasse", disse a professora, que leciona engenharia civil, arquitetônica e ambiental na Drexel University, na Filadélfia.
O contexto político do novo país, para Fernanda, também tem problemas. Na sua opinião, porém, as questões mais graves têm sido superadas.
"Nesse meio tempo, [Donald] Trump foi eleito, o que para mim foi uma decepção com o povo americano. Só que a diferença é que, talvez pelo fato de um presidente nos Estados Unidos ter menor autonomia do que um presidente no Brasil, por conta da autonomia de cada estado, o governo dele [de Trump] não conseguiu acabar com a economia do jeito que Bolsonaro fez", opina.
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